terça-feira, 3 de janeiro de 2017

O mistério do coma e o coma "existencial"

O coma profundo de Mario Soares tem, certamente, dado que pensar a muita gente e não apenas a aquela pequena roda que o tem visitado e dado apoio à família Soares-Baroso, nestes últimos tempos.
O coma continua a ser uma situação misteriosa para a medicina e as neurociências. Mas não é sob o ponto vista do médico e do neurocientista, até porque não sou médico nem me considero neurocientista, que me proponho olhar, neste momento, para esta situação de coma. Faço-o à luz de uma outra abertura que designaria por coma "existencial". Na verdade, é muito difícil determinar a fronteira entre a consciência e a inconsciência. Temos conhecimento de alguns casos em que os sujeitos em estado de coma se encontravam completamente amarrados do ponto de vista físico e biológico sem capacidade de resposta a qualquer estímulo interno ou externo e que permaneciam conscientes ou semiconscientes a muito daquilo que acontecia à sua volta reconhecendo as vozes e o sentido das frases proferidas, como referimos num caso que consta numa das mensagem deste blogue. O coma "existencial" seria algo semelhante a uma certa paragem no tempo, um tempo de espera à entrada do além-tempo mas ainda reversível ou possível de poder voltar ao tempo normal mas sem qualquer reminiscência ou reconhecimento dessa paragem mais ou menos prolongada. Quando "apascento o rebanho dos meus pensamentos" e algum deles mais atrevido se afoita a vir ao exterior, costumo dizer: que até ao fim do tempo ainda é tempo, há tempo, "tempo de salvação", para os crentes,  de passagem para o novo tempo, para o além-tempo, em Deus, Pai, Filho e Espírito de Amor, o Deus Infinitamente Misericordioso, Tardo à Ira, Clemente e Bom, da revelação bíblica no seu sentido mais amoroso e fiel, belo e profundo.
Às vezes, pergunto-me porquê  a algumas pessoas lhe é concedida a oportunidade que é algo inteiramente gratuito, dádiva, graça, desta paragem no tempo antes de entrar no além tempo. Tudo isto é certamente misterioso mas nem por isso deixa de dar que pensar e fazer-nos pensar: que até ao fim do tempo ainda é tempo e há tempo, para fazer a travessia para o além-tempo nos braços da fé e da esperança não só para os crentes mas para todos os homens de boa vontade e de todos os tempos.

Post Scriptum:
Mário Soares partiu ontem às 15.28. A viagem de retorno não se verificou e passou para o além-tempo, onde, porventura, terá ainda mais liberdade do que aquela porque lutou tenaz e resilientemente para si e para os seus concidadãos ao nível nacional e internacional bem como a grande vontade de continuar a viver que sempre alimentou. Isto é válido para os crentes mas também para todos os homens de boa vontade e- no limite - para todos seres humanos que, além das suas convicções no tempo mais ou menos determinadas e persistentes, nunca fecham, na realidade, a janela da esperança a essa força maior de querer viver para sempre que Mário Soares, no seu sentido mais fundo e definitivo, também não poderia nem conseguiria negar. Até ao fim do tempo ainda é tempo e há sempre tempo para o essencial.    

N. B. - Esta mensagem continua em aberto, simplesmente, porque não pode ser fechada e terá de continuar a ser escrita.